"Vivemos
numa época dominada pelo medo do colesterol e pelo culto às
vitaminas, com uma dissolução crescente dos rituais que acompanham
o ato alimentar. O almoço é um pedaço de pizza, em pé, num balcão
qualquer. Assim, é importante pensar que tais mudanças
contemporâneas no comer enquanto um ato social e psicológico, entre
outros.
Por
isso, afirmamos que não se trata de reduzir o sujeito a um registro
psíquico ou social - ambos empobreceriam nossa compreensão.
Acreditamos em buscar um "saber" que determinado grupo
possui, utiliza e que norteia a relação que este tem com o seu
corpo. Uma de nossas entrevistadas nos disse: "consumo é igual
gula...você incorpora sem necessidade". Neste sentido, talvez
os discursos sobre o corpo aqui trazidos, possam ser entendidos como
a melhor metáfora da nossa sociedade. Uma sociedade obesa que,
consumindo em excesso, está permanentemente insatisfeita."
"A cultura
contemporânea valoriza tanto a magreza, legitimada principalmente
pelo discurso da biomedicina, que transforma a gordura em um símbolo
de falência moral, com sérias conseqüências para a subjetvidade
dos que não se adaptam a esse ideal de corpo. Para muitos desses, a
norma que os atira ao gueto de uma repulsa geral torna-se um peso, na
alma, um refluxo sobre si mesmo de um corpo recusado. O reflexo de um
sucesso ou fracasso pessoal. Com o auxílio do cinema e de todo o
aparato da telecomunicação toda uma pedagogia de massa é
veiculada: uma soberania sobre si, o indivíduo pode como nunca
controlar seu corpo e provar sua vontade íntima, sua determinação,
seu valor.
A imagem na
obesidade traz conseqüências e sofrimento, afeta toda a relação
do sujeito com seu corpo, mas não fiquemos cegos só pelo aparente,
é o corpo pulsional, corpo de gozo, que ocupa, primariamente, toda a
cena.
É preciso que esse
sujeito lide de outro modo com sua falta fundamental, e por outro
lado, que se desfaça esse nó de gozo, esse modo de gozar
inflexível, exigente, voraz. O comer compulsivo está do lado da
pulsão de morte, refere-se, por um lado, ao horror de um prazer por
ele mesmo ignorado tanto quanto à atividade do erotismo oral, gozo
oral. Por outro lado, a dieta apontaria para uma tentativa de
quantificação, pois se está sempre contando e somando as calorias,
pesando as gramas da dieta, os quilos a mais ou a menos. Isso
permitiria um ciframento do gozo, portanto algum controle dele.
Assim o corpo, e sua
imagem em especial, ocupam um lugar central na vida do homem
contemporâneo, na relação com o mundo e com seus pares. A
subjetividade contemporânea, como formulou Medeiros, sendo
"descompromissada, desresponsabilizada, alienada, esvaziada de
seus afetos e valores, só lhe teria restado sua aparência. Já não
mais seria a força-de-trabalho do sujeito e sim sua estética que se
prestaria à criação de mais-valia" (2005, p. 21).
O discurso do corpo
fala das relações internas à sociedade e também nele vai se
expressar a busca da felicidade plena. Palco privilegiado dos
paradoxos e dos conflitos, o corpo que busca a sua singularidade é o
mesmo que tenta negar a diferença e a alteridade."
"ESTE É UM
MUNDO PARA HOMENS MAGROS. QUANDO PERDI PESO ERA UM HOMEM POPULAR E
FAZIA EXERCÍCIOS" (MICHAEL HEBRANKO, CONSIDERADO O HOMEM MAIS
PESADO DO MUNDO)
Andrade, A., &
Bosi, M. L. M. (2003). Mídia e subjetividade: Impacto no
comportamento alimentar feminino. Revista de Nutrição, 16(1).
Recuperado em: 15 set. 2003: http://www.periodicoscapes.org.
Amorim,
L., & Sant'Ana, M. M. (1999). A compulsão de comer. Ágora:
Estudos em Teoria Psicanalítica, 1
(2), 21-29.